O PODER DOS 40


A maioria de nós, mulheres, entra nos 40 a medo. Deixamos de ser jovens numa sociedade obcecada pela imagem e por essa ilusão da eterna juventude, e muitas de nós sentem a entrada da maturidade como um passo largo em direcção à decadência.  Se a isto juntarmos o facto de que, entre os 35 e os 40 anos se inicia o processo de perimenopausa, com alterações hormonais que indicam o caminho para a menopausa, tudo se torna ainda mais assustador.

Tal como acontece com a menstruação, a menopausa é alvo de descrições que só relatam incómodos, restrições e sofrimento. De geração em geração, estes temas foram guardados a sete chaves como se fossem vergonhas que temos que esconder, pesos femininos que carregamos em silêncio sobre os ombros. Não devemos falar sobre eles nem incomodar os outros com “coisas de mulheres”.

Se a menstruação representa a entrada na época fértil da mulher e mesmo assim é tão mal vista, tão mal contada, que dizer da menopausa que representa o fim da funcionalidade fértil da mulher? Deixando de servir como veículo fértil, num mundo tão funcional, o que resta às mulheres senão encarar a maturidade e a menopausa como uma espécie de morte em vida?

Pois, minhas caras, tudo isto são mentiras e prisões colectivas que precisamos olhar e transmutar. Embora muitas de nós não se apercebam, o nosso afastamento da natureza e da mulher selvagem que vive dentro de cada uma de nós levou-nos a este triste desempoderamento. A natureza, infinitamente sábia, traz-nos, com a maturidade, alterações hormonais que nos permitem soltar os apegos maternais e a urgência de cuidar de outros. O convite da nossa mulher selvagem é mesmo que nos voltemos a colocar no centro das nossas vidas, que possamos tomar tempo para fazer um balanço do que foi e para onde queremos ir.  A sociedade patriarcal não vê com bons olhos este movimento de auto centramento feminino, porque das mulheres é esperado que cuidem dos outros toda a vida, que sejam suaves e facilmente domáveis.

Quantas vezes vemos e ouvimos que as mudanças hormonais fazem as mulheres maduras enlouquecer, acabando casamentos de décadas, mudando de trabalho, de casa, até de ideias e valores? Pois é todo o contrário. A chegada à maturidade faz-nos ganhar coragem para fazermos o que até então não nos foi possível.

E tal como com as adolescentes e a menstruação, a resposta clínica para todas as questões hormonais é a medicação com hormonas sintéticas, que se substituem aos nossos ciclos naturais e nos afastam da nossa verdadeira essência. Uma espécie de trela com açaime que nos volta a colocar num local ameno e neutro, sobretudo para os outros. A nossa ciclicidade incomoda muita gente e nós aprendemos a ficar incomodadas com ela, apesar da sua importância na busca e achamento das chaves para o nosso bem estar. É dessa forma que o nosso corpo comunica connosco e nos mostra os nossos anseios e desejos mais íntimos.  Com isto não quero dizer que não existam incómodos e questões trazidas por todas estas sinfonias hormonais. Mas há muitíssimas formas naturais de as tratar até porque quando negamos ao nosso corpo a capacidade de sintomatizar negamo-nos a nós próprias o contacto com a nossa alma.

A entrada nos 40 é um convite ao poder e à realização pessoal. Se o soubermos aceitar, todo um mundo novo se abrirá à nossa frente. A vida oferece-nos a hipótese de renascer, de esquecer expectativas e pesos alheios, de trazer atenção aos nossos dons e de gerar, mais que filhos, projetos e sabedoria para o mundo. E o mundo precisa de mulheres maduras que não estejam domadas, dopadas, adormecidas. Somos veículos de vida, gerando ou não filhos. Os nossos úteros, centro de criatividade, estão vivos e a vibrar, sempre. Até mesmo quando já não existem fisicamente nos nossos corpos. Entender a maturidade feminina é entender finalmente o nosso papel no Universo. Entender a maturidade feminina é ser finalmente livre.

 * texto por Catarina Ferreira

*ilustração por Chikovnaya, adaptada por Estevão Rolim - Lux Digital

 

  

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